O congregado pai de 11 que se tornou padre aos 83 anos e foi ordenado pelo próprio filho

Vicente Melillo casou, teve uma família numerosa, realizou diversas obras sociais e depois também tornou-se padre. Conheça sua fascinante história

Por Rafael Caetano, c. m.

A trajetória de muitas pessoas célebres e até santas muitas vezes não têm grandes pontos de virada ou coisas inimagináveis acontecendo. Há quem complete seu o caminho de perfeição trilhando uma pequena via. Esse definitivamente não foi o caso de Vicente Melillo. A história nada convencional do congregado mariano tem início na Itália, em 05 de maio de 1883. Mas, apenas alguns meses depois, em agosto do mesmo ano, Vicente mudou-se para o Brasil com seus pais e aqui se fixaram na cidade de Campinas-SP. Aí começa de fato sua bela, longa e inusitada jornada.

Retrato do Comendador Vicente Melillo publicado no anuário da Federação das Congregações Marianas de São Paulo de 1936

CASAMENTO, FAMÍLIA NUMEROSA E PROFISSÃO

Vicente cresceu, estudou e formou sua família, casando-se com Regina Morato do Canto, a qual lhe deu 11 filhos – três faleceram na infância e oito vingaram, tornando-se o espelho de seus pais católicos e carinhosos: Vicente de Paulo, médico e professor; Aniger, 2º Bispo Diocesano de Piracicaba; Santa, poetisa; Regina, escritora; Irene, assistente social; Zuleika, religiosa da Ordem da Visitação de Santa Maria; Auta, filósofa; Pérola, professora e historiadora.

Melillo foi bastante atuante na vida cultural, social e religiosa de Campinas, a ponto de ser redator-chefe da revista “A Verdade”, redator do jornal “Comércio de Campinas” e do boletim diocesano “O Mensageiro”.
Bacharelou-se em Ciências Jurídicas e Sociais pela faculdade de direito de São Paulo e diplomou-se em Filosofia e Pedagogia pela Faculdade de Filosofia do Mosteiro de São Bento. Por volta de 1920 transferiu-se para a capital do Estado, onde desempenhou altos cargos jurídicos e chegou a lecionar.

CONGREGADO MARIANO

Era congregado mariano da Congregação Mariana Nossa Senhora da Conceição e São Luiz Gonzaga, conhecida como Congregação da São Gonçalo. Por sua capacidade e atuação, destacou-se na Federação das Congregações Marianas de são Paulo, tendo sido seu 6º presidente em 1935, sendo precedido por Dr. Sebastião Medeiros e sucedido por José Villac. 

TRABALHADOR INCANSÁVEL DA VINHA DO SENHOR

Vicente se condoía muito dos pobres e necessitados. Por graça divina, multiplicava auxílios a quantos encontrasse em dificuldade. Assim, em 1935, fundou a “Colônia Agrícola Bussocaba”, no então bairro de Osasco, que recebia idosos doentes e sem lar.

Vicente Melillo não queria para seus internos um mero asilo ou hospital. Sempre dizia que o trabalho e o esforço próprios fazem parte do remédio. Por isso, na Colônia, todos os que tinham condições trabalhavam. Ali não se vivia de esmolas, embora fossem aceitas como complemento. As tarefas agrícolas e outras eram as fontes de sustento dos internos.

Esse congregado incansável também administrava outras três obras, a “Assistência Vicentina aos Mendigos”, que existiu por mais de 30 anos no bairro de Santa Cecília, o “Asilo da Vila Mascote”, que cuidava de crianças e mulheres abandonadas e deficientes, assim como tuberculosos, e o “Lar do Estudante Pobre”, destinado aos universitários.

À procura de um capelão para dispensar os santos sacramentos aos internos da Colônia, Vicente fez insistentes diligências junto a Dom Agnelo Rossi, cardeal de São Paulo. Após muito refletir no assunto, ao visitar a Colônia, Dom Agnelo convenceu-se de que não haveria melhor capelão para aquela obra do que o próprio “Comendador”, como tratavam carinhosamente a Vicente (pois recebera o título de Comendador da Santa Sé, em 1942). Sem hesitar, o “Comendador” aceitou.

ORDENAÇÃO

Nesta altura de sua vida já aposentado, sua condição de viúvo permitia a ordenação sacerdotal e o exercício deste ministério, também abraçado por seu filho Aniger, então o Bispo Diocesano de Piracicaba.

O Cardeal D. Agnelo conhecia há anos, muito de perto, o amor do imigrante italiano pela Igreja Católica, sua sólida formação e cultura religiosa, tanto quanto sua dedicação aos mais necessitados.

E assim, aos 83 anos, em 15 de agosto de 1966, no dia da Assunção da Santíssima Virgem, foi ordenado padre pelo próprio filho, Dom Aniger Francisco de Maria Melillo na Catedral de Nossa Senhora da Assunção, mais conhecida como Catedral Metropolitana da Sé de são Paulo.

O Papa São Paulo VI lhe concedeu algumas dispensas, tais como a da formação em seminário, a da reza diária do Breviário, e a concessão para celebrar a Santa Missa em português – tendo sido o primeiro sacerdote a fazê-lo oficialmente no Brasil.

O Pe. Vicente Melillo celebrou mais de mil Missas em três anos de sacerdócio, falecendo santamente na tarde de 03 de outubro de 1969. Recebeu a unção dos enfermos das mãos do próprio filho, Dom Aniger, as mesmas que o ordenaram padre.

HOMENAGEM

A Prefeitura Municipal de Osasco prestou significativa homenagem póstuma ao grande congregado mariano, dando à via principal do Jardim Umuarama o nome de Avenida Padre Vicente Melillo, em 1970. Naquele bairro está localizada a Colônia Agrícola Bussocaba, que hoje se chama “Lar Bussocaba”.

Uma de suas filhas, Pérola, afirmou sobre o legado dele: “Tu és grande demais para desapareceres. Continuarás neste mundo através de teus feitos, nas pessoas de teus pobres, na vibração de teus escritos, no eco de tuas palavras mas, principalmente, no reflexo de tua fé, de tua grande e inquebrantável fé!”. Além de um filho padre (e, ao final, Bispo), uma das filhas de Vicente e Regina, Zuleika Melillo, seguiu a vida religiosa na Ordem da Visitação de Santa Maria.

 

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